Relato 6)- Santo Daime: Céu de Maria - Trabalho de São Miguel (27/07/2017)

in jornada •  5 years ago  (edited)

Trabalho inteiro sentado nas cadeiras, com alguns hinos em pé e uma parte em silêncio, sem hinos.

Antes de iniciar quero relembrar que saí do último trabalho com muitas dúvidas/medo sobre se continuaria a trabalhar com o daime.

Na semana seguinte após aquele último trabalho, fui me firmando e perdendo o medo. Não queria, depois da passagem, chegar no plano celeste e ouvir: “Te fornecemos um poder imensurável para o seu adiantamento espiritual e você não o reconheceu, teve medo e se afastou do caminho”. E eu consternado dizer “Posso voltar lá?”. E eles “Vai ter que esperar outra oportunidade…”. Além do que, senti no coração que estou no caminho certo. O medo cedeu lugar à coragem, determinação e firmeza no propósito de honrar o esforço que meu espírito fez nesta e em outras vidas para chegar até aqui, e seguir adiante.

O trabalho começou às 21:30. Após as orações e os hinos iniciais, abriu o despacho do daime. Tomei a primeira dose do daime, aquele mais escuro e concentrado, com confiança, consagrando-o antes, erguendo o copo acima da cabeça e depois fazendo o sinal da cruz.

A primeira parte do trabalho foi o hinário de concentração, com ensinos direcionados à firmeza e força. Pois o trabalho de São Miguel é forte.

Aproximadamente meia hora após tomar o primeiro daime, como de costume comecei a sentir a expansão da consciência e já não conseguia mais cantar.

Me firmei pois sabia que a força viria com tudo. E veio.

Fechei os olhos com o propósito de fazer o trabalho todo de olhos fechados para que a troca de foco entre o mundo físico e o espiritual não me enjoasse novamente, como sempre acontece.

Teve início então os hinos dos mensageiros, chamando a falange de São Miguel.

Desta vez não vislumbrei figuras geométricas ou cores, mas no hino de chamada a São Miguel um poder incontrolável tomou conta de mim, me fazendo tremer todo, quase aos solavancos,achei que iria quebrar a cadeira ( escrevendo e tremendo novamente só de lembrar,rs). Mesmo de olhos fechados enjoei, mas fiquei firme no meu lugar e cedi de vez a consciência para aquele poder. Enjoei de novo e quando pensei em sair para fora fui pego por uma força que quase me levantou da cadeira.

NOTA: Daqui para frente não tenho certeza se tudo o que eu vou narrar se propagou para o meu corpo físico ou aconteceu só no mundo espiritual. Tenho quase certeza que sim, pois sentia a cabeça virando para um lado e para o outro.

Consciente, senti o corpo crescendo e se elevando em proporções (em energia e em tamanho). Senti todos os músculos do rosto se contraindo e tomando uma expressão seríssima, austera, onipotente e uma confiança inigualável tomou conta do meu ser. Cerrando os dentes, minha cabeça girava lentamente de um lado para o outro a observar, como se fosse um general observando o trabalho dos soldados. Me dei conta então de que eu havia incorporado este ser grandioso, pois perdi totalmente o controle do corpo.

Engraçado, pois após 2 anos de umbanda nunca incorporei nada, só ajudava os médiuns.

A cada acorde de um novo hino esta consciência aumentava em poder e senti todos os músculos do rosto enrijecidos.

Vez em quando virava a cabeça para um lado ou para o outro e cerrava os dentes.

Terminou um hino de São Miguel e iniciou um hino para a Virgem Mãe. Nesta hora meu corpo se largou todo na cadeira e novamente o campo energético cresceu.

Meu ser preencheu-se de amor. Um amor que não pode ser traduzido em palavras. Senti os traços do meu rosto mudarem para uma expressão feminina, doce, terna.

Assim que a energia se acomodou minhas mãos se elevaram ao rosto em oração. Quando tocou esta parte do hino “E quando eu ordeno, Esse mal vai embora, É em nome de Deus, E de Nossa Senhora” a expressão do rosto se endureceu e minhas mãos fizeram vários movimentos de rotação, como se estivesse girando uma roda nas mãos, e senti que todo o mal estava passando por esta roda. Depois de olhos fechados vi minhas mãos em forma feminina e um rosário entre elas.

Abriu o despacho para tomar a segunda dose do daime mas eu não fui, estava trabalhando ainda.

Depois voltaram os hinos para São Miguel e novamente solavancos, tremores e postura de general.

Depois começou a defumação do salão, cantando pontos de defumação de umbanda. Senti a força dos orixás, um poder de soldado, guerreiro, implacável.

Citaram Oxum em um hino. Incorporei Oxum. Ela também ficou com expressão séria e observava o trabalho, virando a cabeça de um lado para o outro. Quando cantou para Ogum incorporei um soldado implacável.

Senti que a força que se apresentou no início estava diminuindo e a mente aos poucos ia tomando o controle. Então “eu” me dirigi ao despacho para tomar outra dose. O irmão serviu pouco, pois faltavam apenas umas 2 horas de trabalho. “Pedi” para colocar mais um pouco, “dizendo” que tinha muito trabalho a fazer ainda e fui atendido.

Voltei para o meu lugar e novamente São Miguel (de alguma forma sabia que era da falange dele) se apoderou e estava fazendo o seu trabalho. Aí o fiscal veio educadamente me interromper, dizendo que todos estavam em pé e só eu estava sentado. “Consegui abrir os olhos e dizer a ele que estava fazendo o meu trabalho. . Ele me deixou ficar lá sentado.

Senti a cabeça virando e São Miguel olhou firme para o fiscal. Em determinado momento um hino fazia menção a comprovar o poder que ali estava e as minhas mãos fizeram vários sinais complicados.

Começaram os hinos de fechamento e orações. Estes obrigatoriamente em pé. Tentei me levantar mas era puxado novamente para a cadeira. Assim que começou a oração eu novamente incorporei Nossa Senhora, fazendo oração com o rosário. Novamente o fiscal veio me pedir para levantar, dizendo ser uma falta de respeito. Não pude atendê-lo e continuei sentado, sorrindo sabendo que estava fazendo o trabalho que eu havia sido destinado a fazer naquele dia.

Nem no Pai Nosso e Ave Maria eu consegui levantar.

Terminou o trabalho e eu abri os olhos, ainda na força de São Miguel, tentando ficar consciente. Pedi para o meu enteado e um amigo nosso ficarem conversando comigo, para que eu não voltasse a incorporar pois a corrente já havia se dissolvido e o trabalho estava fechado.Este amigo foi perfeito quando falou para sairmos da igreja. Falei que dava para sair segurando neles. Sai com medo de tocar o chão, pois o mundo físico parecia irreal e abstrato. Demos umas voltas, eu andando devagar, sentindo o chão. Na volta passamos em frente ao cruzeiro que fica em frente à igreja e “eu” caí de joelho em frente à cruz. Me levantei e fomos para casa, eu ainda aéreo.

28/07/2017 – Dia seguinte ao trabalho de São Miguel

Quando acordei de alguma forma sabia que ainda tinha coisa para acontecer e que eu iria incorporar novamente, pois estava com aquela pressão na parte de trás da cabeça. Por mais que eu me concentrasse na mente, a pressão permanecia.

Entre dormir e acordar, acordei totalmente ao meio dia. O meu enteado também acordou.

Estávamos conversando e eu senti esta pressão crescendo por trás da cabeça e o rosto crescendo em forma.

Incorporei um índio ancestral que em pé olhava para o meu enteado. Balbuciando com dificuldade disse: “Orgulho”. E apontou para o meu enteado e disse “Guerreiro”.

Lágrimas escorreram pelo meu rosto e o índio passou a mão no rosto e apontou para o meu enteado, como a dizer que eram lágrimas por ele.

O gato veio perto de mim roçando na minha perna e ronronando (o gato não gosta de mim nem eu dele, rs). O meu enteado fez menção de pegar o gato mas o índio pegou o gato no colo e o abraçou e envolveu com uma ternura e um amor que eu nunca havia sentido antes. O gato ficou quietinho no colo dele ( meu colo ), depois pulou para o colo do meu enteado e ficou lá quietinho. O índio ficou olhando para o gato com ternura. Depois olhava o meu enteado com ternura, orgulhoso dele.

O índio esticou as mãos e pediu as mãos do meu enteado, e as apertou firmemente.

Voltei à consciência e disse para o meu enteado que deve ser um ancestral dele e que talvez o meu enteado pudesse fazer alguma pergunta. O índio voltou e o meu enteado lhe perguntou se era recente esta relação entre eles, tipo o avô dele. O índio disse que não com a cabeça e gesticulou dizendo que era de muito, muito, muito tempo.

(Acho que ali aconteceu uma cura para o índio, que não deve ter tido oportunidade de chorar por um ente querido e dizer o quanto se orgulhava dele)

Depois ele saiu e no meio disto tudo eu estava louco para tomar um café. Pedi para o meu enteado fazer para mim, pois a todo o momento eu cerrava a mão esquerda, fechando o punho. Sentei lá fora no murinho e fui pegar a xícara. Quando eu ia pegar a xícara uma consciência puxava de leve a minha mão. Aí eu comecei a rir muito. Eu ia tentar pegar a xícara e esta consciência tirava a minha mão, e ela disse pela minha voz algo como: “nós somos alegria também. E riu”. Até que consegui pegar a xícara. Em um momento voltei rápido a xícara no murinho, pois minha mão enfraqueceu e ela ia caindo. Passou um lapso de tempo que parecia 5 segundos, mas quando fui tomar o café de novo estava super gelado. Acho que passou mais tempo, rs.

Depois, já dentro de casa incorporou outra energia. Esta era diferente, grandiosa, grandiosamente amorosa.

A primeira coisa que ela disse apontando para o meu enteado foi: “Você deve ser muito especial para eu ter que vir aqui falar com um ser humano. Nem me lembro mais quando foi a última vez em que eu vim falar com um ser humano. Eu nem queria vir (sorrindo). Nós falamos e vocês não entendem nada. Esta casca aí que vocês usam recobre todo o amor que vocês são. Falou do amor do Universo, das estrelas da lua, do sol, da criação divina. E falou muita coisa para o meu enteado usando palavras doces, mas duras às vezes.

Em um momento ele falou: “Desculpe se te ofendo, mas não entendo nada de palavras. Eu entendo é de amor. Eu estou passando para o rapaz ( eu ) imagens, figuras geométricas, tons e sinais. Ele é que está falando estas palavras. Se você entendesse a minha linguagem eu não precisaria usar palavras. Coisa estranha isto, cada palavra quer dizer uma coisa. (rindo).De onde eu venho não usamos este negócio de palavras. Mas não sei porque ele (eu) está fazendo caretas. Eu estou rindo”. Aí eu ri

Falou também para o meu enteado que ele era um ser de luz, mas que tinha direito de escolha.

Em algum momento olhei para a minha mão e ele disse “Mexe a mão, eu quero ver se você consegue”. “Você não consegue, porque eu é que estou aqui. Aí consegui mexer a mão. Ele disse suavemente “Para de interferir”. E minha mão não mexeu mais.

Aí ele falou rindo “Acho que falei demais. Vou tomar bronca…” E acrescentou “vou embora já, o rapaz (eu) está passando mal”. E foi embora. Mas eu continuei com os braços dormentes por um tempo. Aí “o meu enteado” inteligentemente leu a prece de encerramento do trabalho e eu fui voltando à normalidade.

Prece de Encerramento:

“Em nome de Deus Pai Todo-Poderoso, da Virgem Soberana Mãe, do Patriarca São José e de todos os Seres Divinos da Corte Celestial, e com a Ordem do nosso Mestre Império Juramidam, está encerrado o nosso trabalho, meus irmãos e minhas irmãs. Louvado seja Deus nas alturas.”

E todos respondem: “Para que sempre seja louvada a Nossa Mãe Maria Santíssima sobre toda a humanidade. Amém.”

A noite, antes de a esposa chegar eu acordei, coloquei com pressa a roupa ( sem motivo nenhum para isto) e cheguei na sala no mesmo momento em que ela abria a porta. Passados alguns minutos meus braços e meu rosto voltaram a formigar fortemente. A esposa é espírita, mas mesmo assim disse a ela que não ficasse com medo que alguém queria lhe passar uma mensagem. Senti a pressão por trás da cabeça mas eu disse “ Não aguento mais isto “. Afinal, estava por mais 6 horas já neste trabalho em casa. Não houve comunicação com a esposa.

Enfim, tenho clara impressão de que estas consciências não dependem do daime para se comunicar, acho que foi aberto um canal com elas e que sempre que necessário se comunicarão..

Autor: Valdemir Nunes da Silva
Originally published at: https://www.recantodasletras.com.br/ensaios/6619476

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