Adaris, Cap. I. SE VOCÊ NÃO VOLTAR, EU TE BUSCO

in livro •  7 years ago  (edited)

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I. SE VOCÊ NÃO VOLTAR, EU TE BUSCO

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-Você sabe o que isso significa? -Excitada, pergunto a Igor, que se recupera do desgaste que sente toda vez que lê mentes. Ele não responde de imediato.

Olho para Jaqueline, a terceira garota que trouxemos para ter sua mente lida por Igor e que agora estava desmaiada, de cara na mesa na qual estamos sentados.

-Mas é claro que sei, Cali. - Igor levanta-se, ainda em sua peruca e maquiagem de seu show drag queen como Madonna. - A tal da Regente existe mesmo.

-Isso quer dizer que... - Diz Alexandrai, incrédula, seu olhar fixo em nada, sua mente a mil por hora.

-Que não estamos nos arriscando à toa!- Eu continuo sua frase, encorajando otimismo. - Que a lenda era verdadeira! Que aquela ...sombra não estava mentindo! Que finalmente Adaris...

Contenho minha voz assim que vejo que estou quase gritando de tanta excitação. Já estavamos há 3 meses procurando por Mabelai, a Regente de Adaris que desapareceu no mundo humano. E para encontrá-la, precisamos fuçar mentes humanas, exatamente o que estamos fazendo aqui agora, no apartamento de Igor.

E pela primeira vez, conseguimos uma pista concreta. Igor, elfo e especialista em telepatia, viu Mabel através dos olhos da humana Jaqueline.

Sim, este foi um grande passo avançado na nossa busca pela Regente!

Que Regente? Que Adaris?
Eu posso explicar.

*Alguns meses humanos atrás, uma coisa que chamo de sombra, composta por vapor, sem rosto e nem corpo, com uma doce voz feminina, veio até mim do nada...

Sentada a beira de meu leito a céu aberto, ouço um barulho estranho, como de tecido se rasgando, em ensurdecedor volume.

Caio ao chão e nele fico, congelada, olhando a sombra dançar a minha frente, se aproximando de mim.

-Caliandrei...- O vulto me chama, sem boca, mas com clareza.

-Como...?- Sussurro, que sai o mais alto que meu medo permite no momento.

  • Não tenha medo, minha querida. Não lhe farei nenhum mal. Apenas quero o seu bem.

-Meu bem?- Indago, em choque. - Quem é você?

Minha mágica, mesmo fraca, já coça em minhas palmas, pronta para ser usada em minha defesa caso isso seja algum tipo de ataque.

-A magia que tem agora correndo em ti não me fará nada. Não é suficiente. - Ela diz.

Posso ouvir meu coração bater quando ela diz isso.
-Como sabe?

-Fadas... sua pífia mágica tem raízes nesta terra, não? Olhe a sua volta. Lhe parece esta uma terra forte?

Mesmo sabendo que a resposta é não, olho a minha volta. Do topo de meu leito, posso claramente ver: Adaris é a mais pura decadência. Fraca, instável, sem cor, sem vida. Eu sei bem onde vivo. Uma lástima.

-Acreditaria se dissesse que nem sempre Adaris foi assim?

-Quem é você?- Repito.

A sombra se aproxima ainda mais. O medo me domina mas não fujo, fico aonde estou.

-Me perdôe se não posso lhe responder, ou se não posso lhe mostrar minha face neste momento. Deve saber que minha mágica, assim como outras, são proibidas em Adaris. Não quero que Garou saiba que estou aqui. Se ouvir o que tenho a dizer, prometo que me conhecerá.

Medo e curiosidade dançam dentro de mim. Meus dedos querem tocar a movente sombra a minha frente, fazer sentido do que meus olhos veêm mas não entendem.
Sou impulsiva; minha mão se estende e a toca. O vapor escuro envolve meus dedos lentamente, formando círculos sobre minha pele. Um ar quente e vivo, lateja minhas veias, quase me queima.

Retraio minha mão. Jamais vi ou senti algo assim.

-O que você quer?

-Te ajudar. Ajudar Adaris. Te ensinar tudo o que precisa saber para recuperá-la.- Algo em sua voz é convincente.

-Recuperar? Do que esta falando?

  • És tão jovem. -Ela lamenta. -É também uma das poucas fadas que ainda vivem, correto?

Não digo nada. Ela não está errada.

-E se eu disser que houveram muitas outras como você? Que Adaris era uma terra verde e fértil, berço das fadas e sua mágica? - Ela espera resposta, mas vê que não respondo, então continua falando. -Talvez eu deva te mostrar.

Meus olhos se fecham contra a minha vontade. Quando os abro, vejo o mesmo lugar aonde estou, mas...

Absolutamente diferente.

O horizonte não é mais roxo escuro, mas verde, em diferentes e brilhantes tons. Flores, plantas, árvores, pedras, água! Todos os elementos, seus sons, odores e essências pintam e cantam a paisagem harmoniosa de Adaris. E fadas! Como eu! Com suas asas coloridas, em diferentes estilos, pairam no ar, cultivando os lírios onde se formam e crescem! Eu nunca vi um desses, apenas ouvi falar que existiam, pois não mais se criam fadas...

As cores quase me cegam. Eu sempre senti essa verdade dentro de mim, mas jamais imaginei que essa Adaris realmente existiu.

Relutantemente, fecho os olhos e grito. A imagem se desfaz e quando os abro novamente, o oco, seco e caído mundo no qual sempre vivi estava de volta e vazio como sempre esteve.

Intactamente sem vida.

-Isso foi real, Caliandrei. Esta era Adaris antes de Garou se apoderar dela. Guendri...

-Guendri?- A interrompi, sem poder conter o interesse em meus olhos. Visto minhas emoções em minhas mangas.- Você conhece Guendri?

-Ele é real, minha pequena.

Guendri, o criador de Adaris e todas as espécies que aqui vivem, é alguém que só ouvi falar pelo nome. Infelizmente, nunca o vi, apesar de ter ouvido que era costumaz vê-lo apreciando o mundo em que criou, confraternizando com sua criação.
Ele aparentemente desapareceu. E ultimamente é dificil acreditar que voltará. Ou até mesmo que existiu.

Sou ingênua por crêr que ele existe, e que um dia voltará?

-Antes de Guendri partir, ele deixou uma de suas maiores criações aqui, para que tomassem conta de Adaris durante sua ausência. - A sombra se move com suas próprias palavras.

-E por que ele se foi?

-Nem tudo tem uma explicação tão fácil, Caliandrei. -Parecia triste. - A mente de um criador sempre será um mistério para sua criação.

Que resposta.
-Garou é a maior criação de Guendri?

-Não! Nunca! A ordem de Adaris é matriarcal. Guendri deixou fadas, das quais criou com seu próprio sangue e as chama de filhas, para proteger seu reino. Não um elfo. Ainda mais um tão petulante.

  • Isso não... isso não é possivel...

Apesar de já ter ouvido falar das filhas de Guendri, nunca pude confirmar, pois ninguém nunca as viu para saber se era verdade. Armas poderosas de combate, potentes fontes de magia não conectadas a Adaris, criadas pelo próprio Guendri para proteger nosso mundo.
No entanto, até agora não passavam disso, lendas.

-Garou sempre foi líder supremo, todas as valkirias o seguem e obedecem suas ordens. Elas não o seguiriam se ele não fosse o escolhido Regente!- Declamo.

-Engana-se, minha cara. Se Garou fosse o regente, Adaris não estaria nesta situação precária, nem a magia tão fraca que seus habitantes mal podem sentir ou praticá-la.

-Garou diz que estamos assim por causa do abandono de Guendri.

-Ele mente.

-E você não?- Retruco.

Ela respira fundo.
-Estou me arriscando ao vir até você. Certamente, nunca viu algo como eu. Sabe qual é a punição para intrusos, não? Ademais, não há mais tantas fadas restantes para quem eu possa oferecer ajuda. -A sombra não para de se mover. - Mas vi em você, Caliandrei, uma oportunidade de colocar tudo em seu lugar. Se não acredita em mim, pode me testar.

-Como?- Pergunto, curiosa.

-Por exemplo, Garou. Sabia que ele conhece pessoalmente uma das filhas de Guendri?

Aguardo mais informação silenciosa e ansiosamente.

-Não só a conhece como a mantém viva aqui, embaixo de seus pés.

Meu choque é audível. Isso era insanidade. Uma filha de Guendri? Existe? Aqui em Adaris?

-A-aonde? -A pergunta mal sai da minha boca.

-Você o serve na corte, não?

Como esse vulto sabe tanto sobre mim?

Por algum motivo, Garou confia em mim. Ofereço a ele pequenos serviços mágicos e camareiros.

-E sabe qual a especialidade dos elfos, sim?

Elfos tem variados niveis de poderes telepatas.
-Controle da mente.-Respondo.- E dai?

-E dai que é assim que ele a esconde de todos. Sozinha, desmemoriada e sem razão para sua existência. Digamos que ao tentar se livrar das Filhas, Garou se afeiçoou por uma, apagou sua memória e a manteve para si.

Garou era um tanto tirano, sim, mas isso... é dificil de engolir.

-Pois bem- Ela continua.- Para provar que digo a verdade, te direi aonde encontrá-la. Mas com uma condição.

-E como saberei que ela é uma das Filhas?

-Olhe entre suas asas. Haverá uma marca que somente as Filhas possuem.

Após pensar por um tempo, aceito a oferta:
-Qual é a condição?

-Você tem que me prometer que procurará pela outra.

E, seguindo as direções dadas a mim pela sombra, e sem deixar Garou saber, encontrei uma mulher sem nome, sem roupas, corpo esculpido de uma amazona, pele negra, olhos verdes com um olhar vago. Em suas costas, entre suas asas, uma marca.
Não acreditei em meus olhos. Uma das filhas de Guendri! Aqui, flutuando em um pequeno lago negro e cristalino no fundo de uma gruta distante e escura.

Ela não sabia nem seu próprio nome.
Mas de acordo com a sombra, seu nome era Alexandrai.

Convencida, e revigorada com possibilidade de um novo mundo frutifero, onde todos possam viver livres em sua magia, ao me reencontrar com a sombra, concordei em ajudá-la sem pensar duas vezes.*

Já se sentiu tão certa do que estava fazendo, de que esta era sua missão, ou que seu propósito enche mais seu peito do que o ar que respira?

Eu sempre soube dentro de mim que essa não era Adaris. Que sempre houve algo melhor. Agora eu sei que é verdade.

Nem mesmo quando entendi o quanto poderia me custar resgatar a regente pensei duas vezes.

Eu precisaria de mágica, e mágica era o que eu não tinha o suficiente naquele momento. Eu precisa enganar Guendri. Ninguém engana a Guendri e continua vivo.

Mas não importa. O futuro de Adaris não tem preço. Alguém precisa fazer algo, e esse alguém sou eu.

Mesmo que isso custe a minha vida.

Se esse é o preço, eu não tenho medo de pagar.

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