Desde sua origem por volta da Revolução Francesa, passando pelas revoluções do século 19 e das transformações culturais do século 20, podemos ver um progressivo declínio dos ideais conservadores. Esta ampla tendência histórica requer uma explicação.
Antes de tudo, devemos caracterizar o que se entende como conservadorismo. Aqui estão duas definições: A primeira, mais histórica e epistemológica, vê o conservadorismo não como uma defesa da ordem social tradicional, e sim como um movimento diretamente ligado ao iluminismo, porém cético em relação à capacidade humana de implementar uma ordem social racionalmente planejada – ignorando coisas humanas difíceis de ser entendidas. De acordo com esta visão, a ordem tradicional não deve ser tomada com uma autoridade inquestionável, mas tampouco deve ser ignorada, pois, por ter evoluído ao longo de séculos, apresenta costumes e instituições testados empiricamente que refletem uma sabedoria para lidar com o ser humano não facilmente entendível pelas ciências sociais. O conservadorismo não se opõe ao iluminismo, ele apenas é mais cauteloso em suas propostas de reforma social, defendendo mudanças graduais, e não radicais.
A segunda definição, que será o ponto central do argumento deste artigo, é mais científica e social, e focada na visão que este movimento tem, implícita ou explicitamente, da própria natureza humana, assim como de um sistema social que esteja em sintonia com ela.
Embora muitos salientem a importância do indivíduo na abordagem conservadora, trata-se de um movimento de viés social. (Como o termo “socialismo” foi apropriado por outras correntes indevidamente, temos que recorrer a outros termos, como “sociocentrismo” ou “comunitarismo”, para caracterizar a abordagem conservadora.) Este viés é um fator fundamental para entendermos o motivo de este movimento declinar ao longo do tempo.
Embora o conservadorismo seja hostil a intervenções estatais sobre os indivíduos, isto não quer dizer que conservadores sejam liberais. Muito pelo contrário, eles entendem que os indivíduos apresentam diversos impulsos negativos, e apenas com a imposição de uma rigorosa ordem estes impulsos podem ser contidos. O ponto central da questão se refere aos agentes que devem estar encarregados da imposição da ordem social. Para os conservadores, este agente não é o estado, e sim a comunidade, com seus costumes e instituições. A religião, em especial, tem um papel fundamental na manutenção da ordem social, mas mesmo algo espontâneo e informal como fofoca é importante. Esses costumes e instituições promovem uma ordem moral que inibe certos impulsos individuais negativos, aumentando a coesão do grupo e seu bom funcionamento.
É este viés comunitário que condena o conservadorismo como movimento historicamente decadente. Três fatores, pelo menos, contribuem para isto: O primeiro é que comunidades, com suas amplas teias morais, só são possíveis em pequenos grupos. As grandes cidades, com suas multidões anônimas e sua diversidade cultural e genética, inviabilizam qualquer possibilidade de uma ordem moral comunitária se consolidar. Em uma situação como esta, apenas o estado pode impor controle sobre os indivíduos, garantindo a boa convivência nos centros urbanos.
O segundo é que, em uma sociedade de mercado, as relações econômicas substituem as relações morais. Profissionais substituem as avós e tias como assistentes das mães no cuidado dos filhos, e asilos substituem os filhos no cuidado de seus pais quando idosos. O dinheiro ganho por mulheres, homossexuais e minorias raciais é igual ao de qualquer outro, assim como o produto de seus trabalhos. Quando a interação entre indivíduos se dá apenas no nível econômico, as relações morais são abaladas contribuindo para a liberdade individual.
O terceiro fator são as tecnologias, que nos oferecem liberdades nunca antes sonhadas, e nenhuma tradição teve tempo para digerir seus efeitos. A televisão permite aos indivíduos obter realização olhando para uma tela ao invés de se engajarem em relações sociais, o freezer e o micro-ondas enfraquecem as refeições grupais ao permitir aos indivíduos preparar seus pratos no momento que quiserem, e os anticoncepcionais livram as mulheres do risco da gravidez, contribuindo para o sexo casual e o consequente enfraquecimento da instituição familiar.
Meu ponto final, que explica o motivo de o conservadorismo estar fadado ao fracasso, é que os três fatores citados anteriormente crescem cada vez mais. Uma percentagem cada vez maior de indivíduos vive nas grandes cidades, a economia de mercado se torna cada vez mais ampla, e as tecnologias, cada vez mais sofisticadas. Como estes três fatores erodem a trama social comunitária e fomentam o individualismo, podemos entender porque o conservadorismo é um movimento defensivo, que ao longo dos anos se torna cada vez mais fraco.
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