Luís de Camões, num dos seus sonetos mais celebrados, escrevia: «Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, /muda-se o ser, muda-se a confiança: /todo o mundo é composto de mudança, /tomando sempre novas qualidades».
O mundo sempre foi composto de mudanças e quase todas as mudanças implicam dor e a dor é uma violência e a violência não deveria ser tão natural como esta sociedade de constante mudança assume com naturalidade.
Ao banalizar-se a mudança como estigma da hipermodernidade produtiva e consumista, está a vulgarizar-se a violência como estigma da mudança.
Se o mundo é composto de mudança nunca a mudança foi composta por tantos mundos que oferecem alterações radicais que geram violência; uma violência de perda com dor, que vai gerar uma espécie de saudosismo, de um tempo em que as ditaduras não davam lugar às mudanças, que geravam, por si só, a violência do protesto de todos aqueles que lutavam contra a paralisia de uma sociedade pobremente só e pela mudança radical de uma sociedade que trouxesse uma liberdade responsável. Mas, se o desejo de mudar de outrora era suportado pela legitimidade da liberdade, hoje este desejo de mudar pouco tem de ideológico, tornando-se uma espécie de veículo de terapêutica contra o vazio existencial. Muda-se consumindo tudo o que as montras oferecem.
Comprar para não envelhecer. Adquirir para estar «updated», para vencer o tempo que naturalmente nos consome.
A última moda, paradigma da mudança, ajuda-nos na ilusão de viver a eterna juventude num primeiro momento e, mais tarde, num «upgrade» da moda contra o envelhecimento e contra a angústia da morte, a intervenção plástica no corpo que prolonga a ilusão de saúde plena, de não envelhecimento, da moda como modo de vida numa sociedade que idolatriza a beleza da juventude e ostraciza o conhecimento da velhice. Mas a violência da mudança não acaba aqui, levando a outro tipo de violência, a uma agressão sobre si-mesmo, que é a experiência do ridículo. E como isto anda tudo ligado, a experiência do ridículo associa-se facilmente ao descalabro da ignorância, à falta de senso comum, à não assumpção de si, para querer assumir uma «persona» que em si não existe nem poderia existir.
Se a mudança nos pode trazer a liberdade de expressão no contexto democrático, também pode convidar, nesse mesmo contexto, à máscara, à eliminação de si, à produção de um outro cuja manutenção é a mudança constante, a captura do tempo para que o tempo aparentemente não se mova de si.
Chegados aqui, surge a violência da contradição insuperável: se o corpo, aparentemente rejuvenescido por intervenções de recauchutagem, exibe uma juventude ridícula porque disforme com a realidade do tempo, já o cérebro não acompanha (até pela ignorância e estupidez que lhe está associada) a mudança científica e tecnológica da hipermodernidade.
Como os gatos castrados que podem sentir o apelo do desejo, mas não podem concretizá-lo na sua expressão.
Estaremos a construir uma sociedade de seres muito belos e castrados cerebrais? Há excepções, mas essas são isso mesmo, excepções.
E como o rejuvenescimento não pára de envelhecer, a violência do consumo desesperante torna o ser cativo de uma aparência que o futuro não perdoa, jamais perdoaria, assim como os seus próprios recursos não perdoarão. Se a paranóia da eterna juventude levou ao desaparecimento dos alquimistas operativos de tempos distantes (e não dos folclóricos que por aí andam na sua banha da cobra característica da «new age» hipermoderna) também levará à falência física e espiritual de todos aqueles que acreditam na eternização do seu aspecto.
Mudar para ficar na mesma. Ou pior: parecido. A mudança das parecenças diaboliza, por sua vez, a mudança pela diferença, pelo conhecimento, pelo pensamento, pela criação. Donde se testemunha a expressão da futilidade do ser que investe para se manter nas mudanças constantes da moda com uma juventude corporal que está fora do seu tempo, criando o tempo ridículo do grotesco, da máscara, do esgar. E isto não é barato. E é aqui que se esconde a falência do ser. O investimento descontrolado na moda supersónica, esquecendo que o ser humano tem o seu tempo de vida nesta engrenagem, conduz inevitavelmente a uma morte prematura por ausência de respeito por si mesmo.
É evidente que os agiotas dos mercados estão atentos à moda das mudanças constantes, pagando muito bem a alguns interventores científicos para que eternizem a ilusão da ignorância numa fraude social.
Foto: José Lorvão
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