Acredito que o aspecto injusto e desumano de um ‘sistema capitalista’ irrestrito como o descrito por Marx é inquestionável. Mas isto pode ser interpretado à luz do que chamamos, no capítulo anterior, de paradoxo da liberdade. Vimos que a liberdade acaba consigo mesma se for ilimitada. Liberdade ilimitada significa que o forte é livre para agredir o fraco e roubar sua liberdade. Por isto que exigimos que o estado limite a liberdade até certo ponto, para que a liberdade de todos seja protegida pela lei. Ninguém deveria estar à mercê dos outros, mas todos deveríamos ter o direto à proteção do estado. Acredito que estas considerações, originalmente aplicadas ao contexto da força bruta e da intimidação física, devem ser aplicadas também ao contexto econômico.
Mesmo que o estado proteja seus cidadãos de sofrer agressão física (como de fato se protege, em princípio, sob um sistema de capitalismo irrestrito), seria contraproducente se ele falhasse em protegê-los do abuso de pdoer econômico. Nesta condição, o economicamente mais forte continua livre para agredir o economicamente mais fraco, e roubar sua liberdade. Sob estas circunstâncias, a liberdade econômica irrestrita é tão contraproducente quanto a liberdade física irrestrita, e o poder econômico pode ser tão perigoso quanto a violência física, pois aqueles que possuem um excedente de comida podem forçar os famintos a aceitar ‘livremente’ a servidão sem precisar recorrer à violência. E assumindo que o estado limita suas atividades à supressão da violência (e a proteção da propriedade), uma minoria economicamente forte pode assim explorar a maioria dos economicamente fracos.
Se esta análise está correta, então a solução é clara. A solução deve ser política: uma solução similar à que adotamos contra a violência física. Devemos construir instituições sociais, reforçadas pelo poder do estado, para a proteção dos economicamente fracos frente aos economicamente fortes. O estado deve garantir que ninguém necessite entrar em um acordo desigual por medo da foma ou da ruína econômica.
Isto, é claro, significa que o princípio da não-intervenção, de um sistema econômico irrestrito, deve ser abandonado; se desejamos salvaguardar a liberdade, devemos exigir que a política de liberdade econômica irrestrita seja substituída por uma intervenção econômica planejada do estado. Devemos exigir que o capitalismo irrestrito dê lugar a um intervencionismo econômico. E isto é precisamente o que aconteceu.
Fonte:_Karl Popper, ‘The Open Society and Its Enemies’, capítulo 17.
Tradução livre de Renan Felipe dos Santos publicada originalmente em https://direitasja.com.br/2018/03/02/karl-popper-e-a-liberdade-economica-irrestrita/
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Como alguém que retira a propriedade de indivíduos sem o consentimento deles, será o garantidor o garantidor da propriedade privada dos mesmos ? isso é uma falácia
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