A crônica da figueira

in cronica •  8 years ago 

Sinto minhas forças se esvaindo…, É inevitável…, minha existência está chegando ao fim! Algo me queima por dentro…, parece que estou murchando… É horrível me deparar, repentinamente, com aquele momento que sempre mais temi. Mais doloroso é ainda, perceber que toda minha vida, que agora passa como um filme à minha frente, foi de uma insignificância tremenda. Valorizei apenas a aparência, e desprezei a essência, agora colho o amargo fruto disso.

Sou a conhecida figueira infrutífera. Plantada em lugar de destaque, sempre recebi os refrescantes ventos do Monte das Oliveiras, e meu viço era saudado por todos os passantes a caminho de Jerusalém. De renomados fariseus a simples peregrinos, todos se encantavam com o verdor de minhas folhas e minha copa robusta e farta, ao que me esforçava cada vez mais para me enverdecer e vigorar, mesmo quando as outras figueiras, pela época, estavam despidas, a se prepararem para a flor e os frutos consequentes.

Muitos se detinham a procurar em mim frutos, desapontando-se por nunca percebê-los, mas a visão da minha beleza encantava-os mais que a frustração por não acharem em mim do que se alimentar. Sempre vi outras tantas “figueirazinhas”, que por se esforçarem para produzir centenas de frutos e alimentarem a tantos, se desgastavam, e feias, não recebiam tantos louvores como eu os recebia diariamente.

Mais que os corriqueiros sinais das estações que se sucediam e eram por mim ignorados, ano a ano, os últimos dias foram de extremo burburinho, a prenunciar acontecimentos grandiosos, que se desenrolavam como o cumprimento de um escrito profético. Algazarra de uma multidão eufórica, a aclamar um homem que seguia montado em um jumentinho. Fariseus a irem e virem, tão preocupados, que sequer paravam para louvar minha beleza. Comerciantes furiosos por terem seus negócios ameaçados. Povo caminhando apressado e animadamente, como que na certeza de terem encontrado o lenitivo que tanto procuravam na vida.

Era manhã, o sol já liberava seus raios, quando vejo passar pequeno grupo a caminho de Jerusalém. Um homem, mais doze. Sua figura era simples, sem pompa, mas de autoridade notória. Tremi até as raízes quando do caminho, ele me avistou. Não olhava para a minha bela aparência. Percebi que buscava por frutos.

O resto da história vocês já sabem… Agora estou aqui me secando… Espero que ao menos o legado da minha morte e meu fim, falem mais que minha insignificante vida, e sirvam de exemplo a muitos…

A crônica da figueira
Leia: Marcos 11:12-14; 20-22; Mateus 12:33-37; Lucas 3:7-18
Por Samuel Amorim Oliveira
e-mail: [email protected]
em 24 de novembro de 2015

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