Esta história que aqui escrevo, retrata algo que pode acontecer em muitas famílias e provocar desentendimentos e mágoas que a maioria das vezes não se compreende de onde vêm. Neste caminho de despertar da consciência podemos perceber o que há para além desses desencontros e quebrar laços de dor que se iram refletir ao longo da vida e de novas gerações. É na família que se encontra o centro de todas as oportunidades para crescermos. Só precisamos esta atentos e conscientes disso.
Uma história de amor entre duas irmãs.
Andeia e Júlia são irmãs. Hoje estão na casa dos trinta, com uma diferença de 3 anos de idade. Andreia é a mais velha.
Desde muito pequenas que a relação entre ambas é composta por momentos de desentendimento, momentos de cobrança, raiva... E, no entanto, cuidam-se reciprocamente.
Têm feitios muito diferentes. Andreia sempre foi uma pessoa sem certezas, muito insegura. Com isso sempre aparentou ser uma distante, fria e até apática em certos momentos. O medo de ser julgada ou rejeitada estavam presentes a todo o instante. O isolamento acabava por ser uma das formas de se defender dos desconfortos que sentia com o mundo exterior. Júlia também era muito insegura, sempre com uma grande ansiedade e necessidade de se rodear de amigos. Manifestava muita certeza no que queria fazer, ditava julgamentos imediatos sobre os outros, ao mesmo tempo que demonstrava muita dificuldade em se adaptar a outras personalidades com quem tivesse que conviver ou trabalhar.
Andreia, muitas vezes, sentiu vontade de esganar (literalmente) Júlia. Ela sentia essa energia nas suas mãos. Nunca o fez, sempre tentou moderar. Muitas vezes chorou porque não compreendia as atitudes de Júlia em relação a si.
Júlia, perdia a paciência com Andreia, pela sua forma de ser. Mas fizesse Andreia o que fizesse, tudo era motivo para que Júlia a julgasse, porque Andreia nunca agia da forma certa.
Conforme foi crescendo, Júlia começou a manifestar-se no que diz respeito à forma como sentia que era tratada pelos seus pais. Ela sentia-se injustiçada, para ela Andreia recebia sempre mais atenção. À Andreia tudo era permitido. Júlia cresceu a pensar assim.
Com isso tratava Andreia sempre com críticas, atacando-a nas suas inseguranças. Pode chamar-se de bullying. Andreia passou realmente a sentir-se insegura na presença de Júlia. Com isso acabava por entrar num certo bloqueio. No entanto, aquilo que a preocupava era que a irmã tivesse uma ideia errada da forma como os pais estariam a tratá-la. Andreia sentia que nada disso era verdade. Com isso, nunca deu verdadeira atenção ao que se foi criando dentro dela.
O comportamento de Júlia, fez com que Andreia crescesse com uma ideia errada sobre si, deixando de valorizar aquilo em que acreditava. As inseguranças de Júlia, a forma como ela tentava fugir ao que sentia, estavam a mexer nas feridas de Andreia.
Este bullying que começou em casa, começou a ser vivido também na escola. Andreia não tinha essa consciência. O facto de serem família, fez com que não percebesse a relação entre os comportamentos. O que mais a preocupava era que Júlia continuava a acreditar que não era tão amada pelos seus pais. Ela via como Júlia tentava receber esse amor e sempre parecia que nunca recebia o suficiente.
Ambas cresceram.
Ao longo do seu caminho Andreia percebeu que precisava olhar para o seu coração. Precisava mudar a sua forma de estar na vida. Havia algo a descobrir sobre si. Percebeu que, há muito tempo, estava desconectada de algo para além de si. Abriu-se para o caminho do coração, o caminho do auto-conhecimento, o caminho da entrega.
Nas descobertas que foi fazendo, a maior foi perceber que era 100% responsável por tudo o que vivia. E que na vida, ela não tinha que se preocupar em ajudar o outro a resolver o seu problema (esta foi uma das formas de estar que alimentou por muito tempo). Era preciso olhar definitivamente para as dores. Não podia continuar a disfarçá-las.
Na sua relação com o outro, estava na hora de se focar naquilo que sentia, naquilo que o outro provocava em si. Estava na hora de dar ouvidos a uma voz que escondeu por tanto tempo.
Em relação a Júlia, Andreia deu conta que, nos últimos tempos, a irmã estava a ser muito constante nas suas críticas, que muitas vezes eram lançadas com um tom de “brincadeira”. Mas essas críticas estavam a magoá-la. Mais, Andreia percebeu que as características da relação das duas, estavam a manifestar-se na relação dos seus filhos.
Hoje, Andreia, sabendo da sua responsabilidade em relação ao que vive, tendo consciência de que a relação entre as duas crianças reflete as questões emocionais a ser resolvidas pelas mães (neste caso) e, sabendo que aquilo que resolver dentro de si, quebrará uma laço que dará a oportunidade a Júlia de se desfazer do padrão emocional que traz, escolhe não mais julgar, escolhe começar por si. Compromete-se a limpar as memórias que Júlia consegue ativar em si, com o comportamento que revela.
Andreia, tem, também, consciência que o comportamento de Júlia tem sido mais frequente, porque está na hora de se libertar definitivamente desta dor que tanto a limita no seu percurso e na concretização dos seus sonhos.
Andreia sabe que é no Amor que as coisas se vão resolver. Júlia está a fazer o seu caminho, no seu tempo. Andreia ainda chora com a dor que sente, mas já não o faz com raiva ou revolta. Confia na escolha que fez.
Andreia sabe que não está sozinha, que neste percurso que escolheu tem sempre uma mão que a aconchega, que lhe dá a força que precisa para abraçar a sua dor e ir para além dela.
Andreia sabe que aquilo que É, é apenas Amor.