O direito à privacidade e ao espaço pessoal

in pt •  6 years ago  (edited)

A proxêmica estuda as distâncias físicas que permeiam as interações interpessoais, e os "efeitos psicológicos" dessas distâncias (ou da falta delas) sobre os indivíduos. O cara que inventou esse termo foi o antropólogo americano Edward Twitchell Hall, Jr, em 1963. Desde então foram realizados vários estudos sobre a importância e a influência do espaço pessoal no nosso comportamento e até na nossa saúde mental.

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Nosso espaço pessoal é uma espécie de bolha física e psicológica, que nos ajuda a preservar nosso equilíbrio interno, nossa auto-estima e identidade.

O Sr. Hall disse que podemos manter quatro tipos de distância dos outros: íntima, pessoal, social e pública (da mais curta para a mais longa). Dependendo da relação que temos com alguém, delimitamos qual destas distâncias é mais segura para que não nos sintamos ameaçados e/ou invadidos.

O tamanho do espaço pessoal pode variar conforme:

  • a circunstância: fazer respiração boca-a-boca ou amparar alguém que está caindo são situações onde o espaço pessoal é flexibilizado em comum acordo, pela necessidade da circunstância. Um estranho toca o outro e está tudo bem com isso.
  • o indivíduo: dependendo da pessoa o espaço pessoal pode ser maior ou menor. Estudos apontam que pessoas ansiosas tendem a precisar de um espaço maior. Da mesma forma algumas pessoas não precisam de muito espaço, e geralmente elas não entendem quem precisa de mais espaço. Quem nunca conheceu aquela pessoa inconveniente que chega perto demais para falar ou encosta em você sem a sua permissão?
  • a cultura local: Alguns povos são mais calorosos e afetuosos enquanto outros são mais frios e impessoais, e isso altera a forma como as pessoas percebem o espaço pessoal. Segue o link para uma matéria sobre o espaço pessoal no Brasil e em outros países: https://www.nexojornal.com.br/grafico/2017/05/08/Qual-%C3%A9-o-%E2%80%98espa%C3%A7o-pessoal%E2%80%99-no-Brasil-e-em-outros-pa%C3%ADses

Algumas pessoas têm o estranho hábito de frequentar lugares cheios de gente, com muitas pessoas encostando umas nas outras, ou quase se encostando (shows, boates, bares, praias etc). Essas pessoas fazem isso porque têm mobilidade: a qualquer momento podem acessar locais mais privativos, vazios e tranquilos. Elas podem transitar em diferentes espaços e por isso não se importam de às vezes reduzirem seu espaço pessoal por algum período de tempo.

Acontece que nem todos temos o privilégio de transitar por diferentes espaços, pelo contrário, alguns de nós vivem a grande maior parte do tempo confinados a espaços restritos e superlotados, sem direito à privacidade e muitas vezes sem respeito à propriedade que é o seu próprio corpo físico.

Na sequência de fotos que segue abaixo temos as mesmas situações acontecendo (na horizontal), porém com um detalhe que as tornam muito diferentes entre si. Dá uma olhada:

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Todas elas são situações do nosso cotidiano, como ir à escola, ao trabalho, ao médico, à praia, ao restaurante, ao salão, curtir nossa casa, usar meios de transporte, fazer compras, trabalhar, etc. Concordo que algumas imagens estão meio estereotipadas, mas mesmo que colocássemos imagens mais verídicas no lugar de outras, ainda assim, no conjunto de tudo, a diferença entre as duas realidades seria perceptível.

Apenas percorra a sequencia da direita e depois da esquerda. Imagine sua vida e sua rotina nesses espaços. Dia após dia, ano após ano. Como foi se imaginar vivendo em lugares apertados, cheios de gente, sem a menor possibilidade de privacidade a maior parte do tempo? Grande parte dos brasileiros vive assim a maior parte de suas vidas, sem poder transitar para outras realidades, onde tenham um pouco de paz, de silêncio, de tempo e espaço consigo mesmo.

A constante invasão do nosso espaço pessoal leva à despersonalização, ao mimetismo social, ao aumento da ansiedade, do estresse, da apatia e não raro da violência. Que sociedade estamos criando e reproduzindo ao permitir que tantos indivíduos, nasçam, cresçam e vivam de forma compactada, inertes não apenas em sua posição social, mas também imobilizados pelos espaços físicos que asfixiam pouco a pouco sua potência e integridade?

PS: Não estou me referindo a todos os espaços contidos nas imagens; a sequencia das fotos foi só para ilustrar como locais privados e públicos podem se mesclar sorrateiramente, propiciando um cotidiano opressivo, que acaba não sendo questionado e passa batido em meio à urgência dos dias de hoje.

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Bastante interesante. Gostei de seu post! Sucesso! 👍🏽
Quanto a questão colocada. Vejo a necessidade de se ampliar o discurso. Visto que a teoria em si, do meu ponto de vista, se aplica a uma sociedade em específico. Como exemplo, não há conexão com sociedades indígenas, quilombolas ou otras sociedades mas distantes, como as encontradas no interior da Sibéria na Rússia. O modelo e a discussão, do meu ponto de vista, é válido a uma sociedade urbana. E quanto a esse último critério, se considerarmos as classes sociais mais baixas não obstante estaremos a mercê de futuras sociedades violentas ou mais violentas que as atuais se não forem criadas políticas públicas que atuem na tentativa de entender e trabalhar melhor esse condição. As ações do setor privado nessa direção não é interessante sem que exista um fator de recompensa.
Sucesso!

  ·  6 years ago (edited)

Oi Adalberto, adorei seu comentário. Boa sacada! Realmente, outros tipos de sociedades podem ter percepções muito diferentes sobre isso, e que podem soar estranhas para nós. Sobre a questão social, eu entendo seu ponto de vista, mas acho que delegar toda a responsabilidade ao Estado (setor público no caso), não resolve o problema. Mas compreendo perfeitamente sua descrença em relação ao setor privado. A sociedade civil organizada tem muito potencial para fazer muita coisa acontecer, mas além da necessidade de recompensa que você citou, ainda tem a apatia e a falta de empatia com o próximo né. Complicado.... Ah, obrigada pelo incentivo! Desejo o mesmo para vc :)

Vou aceitar sua provocação quanto a "descrença quanto ao setor privado"...
Não sou cético quanto a participação do setor privado nesse seguimento ou mesmo estou sugerindo delegá-lo ao estado. No entanto, sendo bastante pragmático. Veja que se trata de políticas quer permitam a sustentabilidade do processo. Como o setor privado vai entrar em uma cadeia como essa, sem recompensas e sem que o governo crie um regra onde eles não venham a ser penalizados posteriormente?
Se você pensar que podemos estar falando de milhões de pessoas nessa situação.
Pessoalmente acredito até que o setor privado já deve ter alguns grupos atuando nesse sentido ou ter projetos em andamento... não tenho como mensurar. Mas é uma hipótese aceitável.
No entanto, quando se fala de país, sociedade brasileira com um todo. Senão for público no total é preciso o desenvolvimento de parcerias público-privadas. E sim. É preciso ter algum tipo de recompensa para que o processo ganhe sustentabilidade. Caso contrário... começa... mas não continua. Você vê isso de maneira de diferente? Ou acredita que isso pode ser feito de maneira exclusiva pelo setor privado?

  ·  6 years ago (edited)

Eu entendo e concordo com o que vc quis dizer. Sobre o setor privado, eu não saberia te responder ao certo o que eu penso, porque existe hoje uma regulação e um monopólio muito grande do Estado sobre o Terceiro Setor no Brasil. Não é qualquer um que pode sair "fazendo o bem" por aí. Existe toda uma legislação, uma burocracia e uma regulação para quem que atuar nessa área. E se você não cumprir os requisitos, você pode perder o direito ao certificado (Utilidade Pública ou de Entidade Beneficente de Assistência Social). Sem esse certificado você perde vários benefícios, como por exemplo isenção de imposto. Tem ONG por aí que atua com CNPJ comercial, pagando imposto como se tivesse lucro, porque não conseguiu ou perdeu a certificação.

Olha que coisa louca isso; você vê um problema social que o Estado não consegue resolver, você se disponibiliza a fazer você mesmo (sem intenção de lucro), mas precisa pedir autorização do Estado (o mesmo que foi incapaz de resolver o problema), e ainda tem que fazer do jeito que ele quer, porque senão ele vai te taxar ou te impedir de tentar ajudar. É muito surreal. Inclusive grandes ONGs internacionais com projetos bacaníssimos desistem de atuar aqui por causa dessa dificuldade toda. Então eu não sei mesmo até que ponto o setor privado poderia ou gostaria de assumir essa responsabilidade, já que o monopólio estatal nunca nos permitiu tentar.

Agradecido pela tréplica. É sempre sim... O Estado tem isso de ruim, de péssimo: O controle exagerado de tudo. Valeu @aliny! Sucesso! ;D

@aliny, Parabéns! O teu post foi votado e resteem pelo Projeto Camões!

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Obrigada!