Já dizia o falecido Ronald Reagan (formado em sociologia e economia), que - em sua visão - o melhor programa social é um emprego. Não dá nem para discordar disso, pois sabemos o quanto a vulnerabilidade social está relacionada à baixa renda e consequentemente ao pouco acesso à serviços e produtos básicos para um vida minimamente digna.
Às vezes olhando para alguns dados, me pergunto se o contingente de desempregados que temos atualmente no país, poderia de alguma forma ser absorvido pela economia formal em seus postos tradicionais, seus padrões de cadeias produtivas, suas estruturas organizacionais e toda essa configuração do sistema econômico tal qual o conhecemos. Encaixar todas essas pessoas nesta máquina que já está operando seria de longe o melhor programa social para todos, pois os tirariam das margens para incluí-los num processo que já se encontra em andamento. Contudo, já dizia Mano Brown:
"Atrasado
Eu tô um pouco sim
Tô, eu acho
Só que tem que
Seu jogo é sujo
E eu não me encaixo
Eu sô problema de montão
De carnaval a carnaval
Eu vim da selva
Sou leão
Sou demais pro seu quintal"
Talvez, olhando esses versos de relance, imaginamos uma pessoa revoltada com a própria situação e culpando os outros por isso, usando um tom ameaçador. Mas olhando de perto a gente entende que, além de uma grande precariedade na formação educacional e profissional - que produz a cada ano milhões de currículos estéreis soltos no mercado - existe também uma questão de defasagem de habilidades sociais básicas, as quais de certa forma, nos domesticam para que possamos lidar com as expectativas sociais no ambiente de trabalho. Habilidades estas, sem as quais multiplicam-se o número de trabalhadores com bom conhecimento e potencial técnico, porém que são demitidos por apresentar repertório comportamental pobre ou inadequado - quando nem ao menos tiveram a chance de aprender o que é um e desenvolver algo nesse sentido . Por isso o jogo é sujo e as pessoas não se encaixam.
Então, não. Não sei se para a nossa sociedade - hoje - o emprego seria o melhor programa social. Pois temos vários programas sociais voltado à inclusão produtiva e eles não estão servindo para reduzir os problemas sociais. Temos vagas que não conseguem ser preenchidas, temos altos índices de turn over, temos nichos de mercado pouco explorados e temos também uma economia formal e padrão que em hipótese alguma tem capacidade de absorver o vasto contingente de gente sem emprego que vaga por aí atrás de bicos quaisquer neste momento.
Sem jamais querer desmerecer o prezadíssimo Reagan, mas pensando na minha sociedade hoje, acredito que o melhor programa social seria o incentivo à contra-economia, principalmente através de meios fortemente descentralizadores como a blockchain (o que praticamente seria uma convocação aos voluntários que já dominam tais meios). O melhor seria apoiar que as pessoas possam gerar renda a partir do ponto em que estão, dentro do contexto em que vivem, com as ferramentas, habilidades e recursos de que dispõem no presente momento, e não somente a partir do momento em que elas conseguirem ser "duas vezes melhores" do que são hoje, e tiverem enfim se equiparado em termos profissionais aos que não tiveram nem metade dos seus percalços em suas trajetórias de vida.
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"Desde cedo a mãe da gente fala assim: 'filho, por você ser preto, você tem que ser duas vezes melhor.' Aí passado alguns anos eu pensei: Como fazer duas vezes melhor, se você tá pelo menos cem vezes atrasado pela escravidão, pela história, pelo preconceito, pelos traumas, pelas psicoses... por tudo que aconteceu? Duas vezes melhor como? (...) Você vai escolher o que tiver mais perto de você, o que tiver dentro da sua realidade"
Mano Brown
Eu acho que as pessoas deveriam ter uma realidade com mais direito às escolhas, e que isso seria um ótimo programa social. E vocês?