PARADOXO BOLSONARO: Denis Rosenfield no Fórum da Liberdade 2019

in pt •  6 years ago 

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Comentários sobre a fala de Denis Rosenfield acerca do governo Bolsonaro neste Fórum da Liberdade 2019.

Assista:


Transcrição do vídeo:

Fala pessoal, nesta semana está ocorrendo a vigésima terceira edição do Fórum da Liberdade aqui em Porto Alegre, sediado na PUC do Rio Grande do Sul, que é onde fiz minha graduação e atualmente tô fazendo meu mestrado em filosofia.

Bom, no primeiro dia de Fórum nós tivemos falas espetaculares, bastante provocativas e que levantaram as esperanças da galera por um Brasil mais liberal. Alexandre Garcia, Gustavo Franco e mesmo o Onyx Lorenzoni foram algumas personalidades públicas que estiveram presentes e tentaram animar a plateia com suas ideias — ainda que, claro, o Onyx tenha sido o desastre do dia, com um discurso populista, falando em 10 Lições de Ludwig Von Mises quando na verdade são 6 Lições, chorando ou fingindo choro durante sua fala, pagando pau pra Bolsonaro, enfim... Aquela velha política populista e sempre se fazendo de roupagem nova.

Aliás, se por um lado a gente teve o Onyx chorão, por outro tivemos um filósofo e articulista crítico do governo Bolsonaro iniciando o evento, e o nome dele é Denis Rosenfield.

MAS ANTES de a gente entrar na fala do Denis Rosenfield, que tal deixar a tua curtida aí no vídeo? Sério, curtir vai me ajudar muito a trazer essa reflexão pra mais pessoas, pois o YouTube destaca vídeos que são curtidos. Se você não gostar, pode descurtir ao final do vídeo, e deixar tua crítica nos comentários. Prometo que não apago comentário de ninguém, talkei? Enfim, vamos pro que interessa...

Em sua fala, o Denis nos fez refletir sobre dois conceitos de política que se confrontam no atual governo, citando então que essa oposição geralmente feita entre conservadores versus liberais não é tão simples quando avaliadas por esses conceitos.

O primeiro conceito é o de política baseada na distinção entre amigos e inimigos. Trata-se aí de uma forma de fazer política que é totalitária.

O segundo conceito é o da política como atividade propriamente democrática e parlamentar, com abertura à negociação na sua composição, sendo então uma política que é democrática nas suas bases e também em sua execução.

Bom... O Denis fala que o conceito de amigo e inimigo foi elaborado por um teórico do Nazismo chamado Carl Schmidt, que fazia uma distinção pra caracterizar a atividade política, que era a ideia de que “o outro é sempre considerado como inimigo, e não como um adversário a ser convencido.” Nesse sentido, uma política desse tipo olha pro inimigo e tenta aniquilá-lo, abatê-lo, desprezá-lo.

“Ah, Alysson, mas o governo Bolsonaro não tá perseguindo nem matando ninguém, logo é exagero dizer que ele tá querendo aniquilar o inimigo”.

Bom, antecipando essa crítica é que o Denis diz que o inimigo não precisa ser real, ele pode ser imaginário, simbólico... A aniquilação do inimigo, portanto, pode ser também simbólica, a fim de descredibilizá-lo frente à opinião pública.

Trata-se aí, como o Denis coloca, de uma luta à morte, traduzida pelo objetivo de eliminação do outro. Se o outro deve ser eliminado, portanto, ele não é alguém com quem a gente possa compor ou negociar. É simplesmente alguém a ser abatido.

Aqui vale destacar que Bolsonaro, se é que não vê, ao menos pinta os parlamentares como corruptos, como se a política enquanto negociação fosse simplesmente o mesmo que corrupção de negociação. É nesse sentido que Bolsonaro usa o termo "velha política".

O que vemos ser utilizado no governo Bolsonaro é o conceito totalitário de política, da política como eliminação do outro, ainda que uma eliminação simbólica, acusando o outro de esquerdista, de extrema-imprensa, de inimigo do país e por aí vai. Esse tipo de política vem da lógica militar, que é a lógica da guerra, da ideia de que o inimigo é alguém a ser abatido, com quem não há composição possível. Ele deve simplesmente ser destruído, sem meio-termo. Ou seja, a Política Democrática não entra na lógica da guerra, nem mesmo a Diplomacia, que é uma forma desse tipo democrático de política de composição e negociação com o outro.

Ou seja, o que distingue a política democrática, segundo o Denis Rosenfield, é que ela é necessariamente uma Política de composição, basicamente parlamentar, não importando se é presidencialista ou parlamentarista. Ela exige negociação com o outro, separação de poderes, reconhecimento do judiciário como reparador de conflitos, e por aí vai. Logo, o coração da democracia é o regime de convencimento e de negociação.

Pra ilustrar esses conceitos é que o Denis traz exemplos do que tem feito o governo Bolsonaro, citando então o período eleitoral, em que Bolsonaro apostou na relação amigos contra inimigos, aplicando a narrativa dos bons versus os maus, dos virtuosos contra os pecadores, sendo portanto “contra tudo que tá aí”, o que atacou tanto a imprensa quanto a atividade parlamentar propriamente dita.

Do ponto de vista eleitoral, o Denis pontua que essa campanha do Bolsonaro foi muito bem sucedida. Isso porque Bolsonaro se baseou no ataque, no apontamento de dedo, na constante tentativa de deslegitimar seus adversários, que são tratados como inimigos não apenas dele, mas também do Brasil, inimigos da pátria — afinal se você critica o presidente, por essa lógica simplista, você deve ser um agente infiltrado no país em nome da revolução comunista.

E bem... Como a campanha do Bolsonaro era pela ofensiva contra pessoas e as ideias dessas pessoas, não havia então a necessidade de investir tanto em publicidade na grande mídia ou nos meios tradicionais pra divulgar a sua chapa nas eleições.

Na verdade, dado que as redes sociais se caracterizam pela economia de palavras, como por exemplo o Twitter que te permite soltar polêmicas a cada 280 caracteres, isso facilita e fomenta o ataque, pois não é como se a rede social estivesse desenhada pra favorecer as nuances próprias de uma conversa séria entre adultos educados; tá mais prum espaço onde você deposita suas opiniões rasas e suas paixões mais variadas e espera que isso convença as pessoas, o que é ainda mais fácil de acontecer quando essas pessoas já têm torcida pré-definida.

Ou seja, Bolsonaro valorizou as redes sociais porque facilitam a sua forma de fazer política, que é anti-politica — assim como apontei no meu vídeo sobre a ideologia anti-ideológica de Jair Bolsonaro, expressa quando ele tomou posse como presidente.

Mas o Denis não tá ali pra simplesmente atacar o governo Bolsonaro. Na verdade ele tá atacando um comportamento nocivo à democracia, e percebe que o padrão aplicado por Bolsonaro apenas se repete, pois a mesma coisa aconteceu no governo petista, que se utilizou da política como aniquilação do inimigo, pintando o discurso de Reacionários versus Progressistas, conservadores contra progressistas, rentistas contra trabalhadores, políticos contra professores e por aí vai. Trata-se de uma lógica binária que opera em ambos os governos, sendo portanto uma lógica que se estende há mais de década.

Só que pro Denis tem uma diferença aí entre os governos: enquanto Bolsonaro tá tendo dificuldade de negociação com o parlamento dado que seu discurso deslegitima o parlamento, o Lula não teve problema com o parlamento porque, no fim das contas, ele comprou o parlamento. Pro Lula, ou os parlamentares eram picaretas ou agentes úteis pra fazer negociatas do interesse do Partido. E a gente percebe isso dado que pelo governo petista houve várias tentativas aí de controle dos meios de comunicação e mesmo de aparelhamento do estado. Aliás, a gente viu esse desejo petista de controle da mídia também por parte de Lula no período pré-eleitoral, quando as denúncias públicas contra ele estavam bombando e ele ainda não tinha sido preso. Da mesma forma, Bolsonaro tenta calar as imprensas detectadas como inimigas, como por ex. a Folha de São Paulo, retirando então financiamentos do Estado — ou seja, não é porque o ideal é ter financiamento nenhum, a motivação não é liberal de enxugar o Estado, e sim de calar a crítica.

O que a gente percebe, portanto, é que no momento em que Bolsonaro se considera representante de uma “nova política”, que na verdade é tão velha quanto o governo petista, e o resto que não for conveniente ao Bolsonaro é, então, entendido como sendo o mesmo que velha política, o que ocorre aí, nessa dicotomia entre nós e eles, é que se impossibilita a negociação, ocorre uma desconsideração do outro, uma desconsideração dos fundamentos democráticos. Ou seja, o projeto reformista no Brasil não tá avançando por conta dessa concepção específica de política de eliminação do inimigo, que pro Denis é uma posição de tipo "conservadora" que tá matando a pauta liberal.

Nesse ponto aí eu tenho uma crítica ao Denis, porque ele cita Edmund Burke, que era um filósofo clássico do conservadorismo, que prezava pelas tradições, e fala que Burke, enquanto conservador, tinha apreço pelo liberalismo, e a gente pode notar isso nas trocas de correspondência entre Burke e Adam Smith. Isso porque o Denis cita o conservador nesse sentido inglês, de conservar as instituições, pra então dizer que Bolsonaro é um “tipo” de conservador.

Olha, Denis..., ao meu ver chamar Bolsonaro de conservador é elogio, isso porque o conservadorismo, ao menos em sentido clássico, que é o sentido respeitável do termo, preza não apenas pelas tradições como, também, fundamenta o apreço pelas tradições no fato de que são as instituições de uma república ou monarquia a grande prova da força benevolente da tradição, uma vez que para manter um aparato estatal de liberdades individuais constitucionalmente protegidas é preciso bastante teste de provação ao longo dos séculos.

Nesse sentido, se Bolsonaro é alguém que demoniza o parlamento, que demoniza os inimigos e deslegitima as instituições, ele não é um conservador. Na verdade, Bolsonaro é um reacionário, uma categorização que o conservador português João Pereira Coutinho faz muito bem no seu livro “As ideias conservadoras explicadas a revolucionários e reacionários”.

Em outras palavras, um conservador não opera por uma lógica de exclusão do outro. Acima de tudo, sua lógica é a da manutenção das instituições políticas, e não da sua descredibilização frente à sociedade.

Mas bem, o Denis Rosenfield tá super certo em pontuar que Bolsonaro fica preso a essa lógica reacionária da exclusão e ele não avança a pauta liberal. Isso porque, como ele diz, tuitar não é governar, porque governar significa compor, avançar propostas, negociar e tudo o mais que um governo exige pra se conservar.

Até aqui a lição mais importante que o Denis traz é que a gente não deve ter medo da palavra negociação, porque isso é perigoso, pode pintar toda forma de negociação como algo escuso, algo que é feito às escuras, apenas pra desviar dinheiro ou coisa parecida.

E quando a gente pinta negociação como sinônimo de corrupção, o que ocorre é pintar a democracia como corrupção. Só que nada há de inerentemente corrupto ou de mau em compor e negociar na política, isso porque essas coisas são pré-requisitos da democracia. Logo, não adianta chamar a negociação entre o presidente do executivo com os parlamentares do legislativo como algo da “velha política”, pois, como diz o Denis, isso é meramente uma figura retórica que não alcança a profundidade do problema da necessidade da negociação e da composição.

O Denis também cita brevemente o Olavo de Carvalho nesse meio-tempo, e embora ele diga que tem uma relação positiva com o Olavo, ele admite que a narrativa conspiratória do Olavo de Carvalho é a da relativização dos valores liberais. Dado que a família Bolsonaro comprou as conspirações olavistas, o que acontece é que, enquanto nação, a gente acaba ficando refém de uma briga de amigo versus inimigo. É daí então que surge essa política "anti-establishment", contrária às instituições e ao modo de fazer as coisas que tem vingado pela tradição até aqui. E então o Denis pergunta se, a depender desse pessoal que tá no poder, será que nós vamos varrer as instituições?

Bom, uma coisa é certa: Esse modelo conspiratório está sendo prejudicial ao projeto reformista da sociedade. Chamar Bolsonaro de conservador ou reformista, portanto, é problemático porque não condiz com o jeito de fazer as coisas que Bolsonaro tem praticado. Isso porque a reforma da previdência não avança, Bolsonaro fica empurrando ela pros parlamentares quando todo mundo sabe que ele precisa antes negociar; ao mesmo tempo, também a reforma tributária tá uma balbúrdia institucional que não se concretiza e se altera antes mesmo de ter seu mérito tratado, enfim... As reformas necessárias pra colocar ordem na casa estão sendo relativizadas, enquanto o presidente prefere comemorar o golpe de 64 e defender que são os militares que garantem a democracia e direitos civis, e não as instituições.

Aliás, aqui é que tá o ponto máximo da lição do Denis Rosenfield em sua palestra: tá rolando um fenômeno curiosíssimo no governo Bolsonaro, que é o papel dos militares. Isso porque os militares estão sendo sinônimo de ponderação e estão demonstrando um profundo respeito pelas instituições democráticas.

Você não vê, por exemplo, uma entrevista sequer de um oficial do governo, que seja militar e que não seja o próprio Bolsonaro, defendendo algo contrário aos preceitos democráticos mais basilares da nossa sociedade. Os militares, à exceção do nosso presidente, e bem representados então pelo nosso vice-presidente, General Mourão, estão demonstrando que sabem fazer política democrática, embora tenham sido treinados na arte da guerra. Só que, enquanto isso, os bolsonaristas falam em extrema-imprensa e querem abater o inimigo, mostrando que eles estão convencidos de que há um mal na terra e esse mal é o esquerdismo, que deve ser varrido do Brasil custe o que custar.

Vejam, então, que os militares, que foram treinados nessa lógica da guerra e sabem muito bem o que significa abater o inimigo, estão na verdade fazendo política, eles estão negociando, respeitando as instituições, seguindo a política democrática. Enquanto, de outro lado..., um grupo de civis segue a lógica da guerra.

Exposto pelo filósofo e articulista Denis Rosenfield na palestra de abertura deste Fórum da Liberdade 2019, esse é o paradoxo do governo Bolsonaro.

Enfim pessoal, quero saber de vocês o que acham disso tudo. Afinal, essas duas concepções de política, sendo uma a política totalitária, de aniquilação do inimigo, e outra a política de composição, de negociação com o adversário... Até que ponto vocês acham que cada um desses modos de fazer política se justificam? A gente deve banir pra sempre algum desses modos, ou ambos são necessários em alguma medida?

Aliás, dado que é visível que Bolsonaro aplica o modo totalitário de fazer política, ainda que ele não esteja aniquilando fisicamente ninguém mas tentando difamar publicamente no nível simbólico seus adversários... Em que exatamente vocês acham que o Denis Rosenfield erra nessa crítica? Afinal, se o governo do PT fez isso, Bolsonaro pode fazer também? Um erro justifica o outro? Como é que é isso?

Bom, se vocês gostaram desse papo e querem me ajudar a manter este canal financeiramente, é só acessar padrim.com.br/Alysson e escolher a forma de financiamento que cabe no seu bolso. Eu realmente preciso dessa grana pra poder dar conta desse projeto, então eu conto com vocês!

Meu nome é Alysson Augusto e a gente se vê na caixa de comentários. Forte abraço.

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