Um Compromisso com o Infinito - Parte 2

in pt •  6 years ago 

A primeira coisa que sentiu ao voltar a si foi o contato das costas contra a superfície dura de uma esteira. Não sabia onde se encontrava, apenas percebeu por uma fresta de luz fraca que passava por debaixo da porta que era um pequeno quarto. Com medo e assustado, quis se levantar, mais foi impedido por uma mão vigorosa que segurou o seu braço. Escutou a voz grave de um homem dizendo:

– É melhor ficar quieto, você sofreu um acidente e bateu a cabeça, por enquanto é melhor não fazer movimentos bruscos.

Realmente sentia seu corpo todo dolorido, e disse:

– Quem é você? Onde estou? O que aconteceu?

– Você foi atropelado e não lhe prestaram socorro... – Continuou a voz com serenidade, intercalada por longas pausas – Teve sorte... O barulho me despertou e resolvi te ajudar... Caso contrário você passaria a madrugada ferido e desmaiado lá fora... Agora se encontra em minha casa e estou cuidando para que você melhore... Não se preocupe. Não lhe farei mal... Descanse.

Apesar de assustado por se encontrar em um local estranho e escuro, ouvindo a voz de um desconhecido, Marcus não tinha saída, todo o seu corpo doía, e só lhe restava esperar. Conforme a luz da manhã entrava no quarto, podia perceber com mais nitidez os contornos do lugar; achava-se em uma cabana humilde com telhado construído com palhas e lona, e paredes de barro. Fez um último esforço para se levantar, mas não foi possível, foi rendido pelo cansaço e adormeceu.

Teve um sono conturbado até acordar novamente gritando devido ao mesmo pesadelo que o atormentava e perseguia implacavelmente. Também sentia muita dor. O velho deu-lhe uma bebida quente de gosto amargo para beber em uma cuia:

– Beba isso, e vai melhorar!

A dor era tão intensa que resolveu obedecer e confiar no estranho, que em seguida colocou uma grossa camada de folhas sobre o abdome de Marcus que em poucos minutos adormeceu novamente. Desta vez teve um sono profundo, tranquilo e reconfortante.

Ao despertar novamente sentia-se melhor. Fez esforço para se levantar e olhou em volta. Esfregou os olhos para se acostumar com a claridade que vinha de uma porta aberta. Eram os raios de sol que batiam em seu rosto. A casa do velho ficava no alto de um morro e podia-se ver o sol se pondo no horizonte ao longe. O brilho alaranjado ofuscava sua visão. Havia dormido o dia inteiro. Vagarosamente se ergueu e andou cambaleante até a porta, seu salvador estava sentado no quintal sobre uma pedra achatada e olhava para as montanhas ao longe, seu corpo parecia absolutamente imóvel, como se fosse uma estátua.

Marcus se aproximou com dificuldade e balbuciou:

– Obrigado Sr...

– Emiliano Souza ao seu dispor – retrucou o ancião que continuava como que paralisado e só movia os lábios para falar... – Pode-se dizer que você teve sorte, mas a explicação correta é que você foi guiado até mim pelo poder do espírito.

Sem entender o que o estranho estava querendo dizer, o jovem estava agitado, impaciente e conturbado.

– Olha, muito obrigado mesmo por me ajudar, mas que história é essa de espírito? Agora preciso ir para casa, minha mãe deve estar preocupada, você teria um telefone, acho que perdi meu celular.

– Está sobre a mesa, mas parece estar quebrado ou desmontado, de qualquer modo seria inútil, aqui devido a esta enorme pedreira, o sinal não funciona.

Marcus olhou pra cima e reparou que havia uma enorme pedra logo acima da casa, que era contornada por uma pequena trilha na encosta íngreme, pelo visto tinha sido carregado para baixo pelo velho enquanto estava desmaiado.

– Preciso ir embora...

– Pode ir, quando precisar e quiser entender o que tentei lhe dizer sobre o espírito, você pode voltar e conversamos. Ande devagar... Não faça movimentos bruscos, você bateu a cabeça com força, mas creio que não foi grave.

– Desculpe, mas tenho mesmo que ir, mais uma vez obrigado...

– Não me agradeça, agradeça ao Espírito, parece que ele reserva um destino extraordinário para você...

– Desculpe, mas não acredito nestas coisas...

– Vai ficar pedindo desculpas a cada minuto? Não há necessidade disto aqui... E não importa se acredita ou não, se não acredita é até melhor assim, o Espírito age independente de sua fé.

Neste momento o jovem percebeu o peso de algo em seu abdome, apalpou com as mãos e percebeu que eram folhas que estavam amarradas com um pano em volta de sua barriga.

– O que é isso...?

– Ah, percebi que você estava tendo pesadelos, por isso amarrei estas folhas especiais ao redor da sua barriga, isto vai te proteger durante a noite, guarde elas e sempre as amarre deste modo, antes de dormir, vai se sentir melhor.

– Que coisa estranha... tem certeza que isto funciona?

– Você ainda não está pronto para compreender, um dia talvez você volte aqui quando for o momento certo. Pode ir agora... – e deu um empurrãozinho amigável em seu ombro. Marcus queria se voltar e perguntar sobre as folhas, mas o tapinha lhe deixou uma sensação desconfortável que lhe obrigava a andar sem olhar para trás e ir embora.

Continua...

Leia mais em: Pedro Canella - Todos os Artigos

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Interessante o conto amigo.... gostei... essa é a primeira parte dele?


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Legal! Vão ser capítulos, e é a segunda parte! leia a primeira aqui: Um Compromisso com o Infinito

@pedrocanella muito legal a historia, estou indo ler a primeira parte. Tenho vontade de escrever, mas não sei por onde começar. De quanto em quanto tempo os capítulos serão publicados?

Que bom que curtiu! Vou tentar publicar um por semana e criar uma saga. Eu também tinha uma preguiça imensa de escrever, só consegui por em prática depois de entrar para o Steemit. Comece e verá que a coisa flui... Em breve teremos novidades nesta área de literatura. Por enquanto tem o projeto #trovadores mas está para sair um concurso de contos no Steemit. Fique ligado. Obrigado pela leitura e comentários.

É um ótimo conto, vou ler a primeira parte e seguir, fiquei curioso😊

Que bom que gostou, vai ser uma saga e vou tentar continuar com pelo menos mais 1 capítulo novo por semana

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Muito obrigada por participar da iniciativa #Trovadores . poesia e prosa!
O seu texto já está na edição de hoje da desta curadoria.

\Abraços/
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Maravilha! Obrigado.

Agradecemos nós :)

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Thank you very much. I will be dedicating myself to continue to publish other works like this. And I'm already following.

Um Compromisso com o Infinito - Parte 2 do B

O que Marcus não sabia, sequer desconfiava, era que a intenção de Emiliano correspondia à do próprio Espírito. Não que fosse Emiliano mais que um homem comum, mas nele havia cicatrizes que um homem comum jamais perceberia. De fato, tudo que nele de humanidade restara, reduzira-se a um resquício da saudade do que ele fora um dia. Em Marcus, Emiliano vira a si mesmo, ou melhor, uma sombra do que teria sido, não fosse a própria ironia um dos sopros do Espírito a lembrar-lhe que sempre haverá uma surpresa a demolir a convicção mais firme.

Há dessas gentes por aí: Marcus que se encontra, sem desconfiar, com uma sombra futura. Um enlace de destinos, um comando universal do qual não se pode fugir, enfim, mil formas têm as circunvoluções da intencionalidade espiritual. Muito pensara Emiliano acerca desse enlace. Se constatara a inevitabilidade desse trabalho, assim designara a situação que lhe fora posta a frente, é porque ainda residia em seu âmago algo a ser conduzido e tratado pelo lado de fora, sob a suspeita permanente do lado de dentro. Marcus fora posto diante dele para lhe ensinar algo valioso de que ambos necessitavam.

Emiliano acompanharia Marcus em sua jornada, porque em Marcus estaria o tratamento de que necessitava: ironia, pensou, quando por fim decidira por aceitar a própria sorte. A imagem do centauro, curandeiro magistral incapaz de curar a si mesmo, viera-lhe à mente. Sou um centauro de carga, referira-se a si mesmo naquele tempo presente que nascera passado.

Mil noites ponderou Emiliano sobre os caprichos do Espírito. Mil estrelas contemplou imaginando-se filamento dessa tessitura de dobras iluminadas que curvam espaços e tempos na vasta e inapreensível geometria do Infinito. Por certo, Marcus não fora o único. Tantos outros atravessaram seu caminho, cada qual com sua ferida a ser tratada, de modo que cumprira sua tarefa de dar alívio a quem dele precisava. Porém, tantas foram as vezes que o Espírito lhe soprara mil eventos de incompreensível vinculação à realidade maior da consciência, que aceitara ser o que lhe fora destinado, ainda que para isso devesse simplesmente agir sem saber por quê. Confiava. E isso era tudo.

Houve, no entanto, um momento fugaz em que pressentiu a presença de um sentido naquilo que fazia. Como se, por gracejo do Espírito, a ele fora confiada breve espiada no plano maior: Marcus haveria de lhe revelar uma chave. Marcus haveria de lhe conduzir a um desvio necessário em sua jornada rumo ao Infinito.

No plano maior, vira a si mesmo mirando-se diante de um espelho: de seus olhos fluíam filamentos verdes-alaranjados em uma fina cascata de luz suavemente entrelaçada, formando no chão uma poça de luz viva. E nela, a imagem de uma criança sussurrando uma palavra de origem desconhecida: "ashminiah…"

Diante dessa lembrança, Emiliano ponderou desesperançado sobre o sentido que poderia haver nisso tudo. Ironia, pensou, considerando as sutilezas da manifestação do Espírito. E sorriu, acolhendo dentro de si todo o mistério do mundo.

Mas, de repente, destravou-se um sentimento súbito. Aquela criança, convencera-se, era Marcus, mas não o jovem que ele encontrara. Marcus, era um outro ele mesmo, alguém de cuja sombra ele mesmo fora um dia. Ashminiah, repetiu, ao respirar o entendimento puro: somos seres multidimensionais atemporais.

Eis a mensagem que o espaço diz a todo tempo: "eu sou um outro você".

Continua… (do B)

Atenção: este post poderá ser editado a qualquer momento, alterando completamente o rumo da história paralela que não se prende ao tempo ou ao espaço, não se sujeitando, pois, às leis da causalidade.

Rapaz, que viagem! Estas tuas palavras estão fazendo aflorar em mim diversas lembranças-premonições desta história, ainda não contada mas já gravada na eternidade. Creio que este turbilhão de sonhar silencioso poderá aos poucos vir a ser traduzido em novos capítulos...